Desenvolvimento das competências socioemocionais ganha espaço no Ceará e fortalece perspectiva da educação integral

12 de dezembro de 2018 - 17:09 #

O modelo de educação que visa à emancipação do ser humano, a partir da valorização das individualidades e da elaboração de um projeto de vida baseado nas experiências pessoais, vem ganhando força no Ceará. Considerando que a formação integral contempla não apenas a aprendizagem de conteúdos formais, mas engloba ainda noções de convívio, de cidadania e autoconhecimento, a Secretaria da Educação (Seduc) vem apostando no desenvolvimento das competências socioemocionais no âmbito escolar, tanto que há um ano lançou política específica sobre este tema.

Nesta quarta-feira (12), em comemoração ao primeiro aniversário da iniciativa, foi realizado um encontro com cerca de 300 educadores, entre gestores escolares e professores, numa promoção conjunta entre Seduc, Secretaria Municipal de Educação de Fortaleza (SME) e Instituto Ayrton Senna. O evento contou com palestras dos psicólogos e pesquisadores Oliver P. John, professor da Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos, e Filip De Fruyt, docente da Universidade de Ghent, na Bélgica. Também participaram a diretora do EduLab21 (Instituto Ayrton Senna), Tatiana Filgueiras, e os secretários da Educação Rogers Mendes e Dalila Saldanha, respectivamente do Estado e do município de Fortaleza.

Entre os debatedores presentes prevalece a compreensão de que é preciso fortalecer as relações interpessoais na escola, promovendo o diálogo e a aproximação entre os agentes do processo de ensino e aprendizagem. Como destaca Rogers, o desafio da década de 1990 era proporcionar acesso à educação para todos os cidadãos. “Agora, precisamos pensar na educação para cada um, e isso faz muita diferença. Porque, quando falamos em ‘todos’, não vemos faces, sentimentos e características pessoais. A educação inclusiva precisa desmassificar o ensino e levar em conta as individualidades de cada um, não tratando os alunos como sendo um todo homogêneo, mas, como sujeitos que têm características próprias”, explica.

“Este é o caminho para montar um projeto político pedagógico adequado e eficiente. Queremos dar uma intencionalidade a este assunto. Precisamos ter metodologia e estrutura, mas não podemos ficar na instrumentalização que não traz emancipação”, argumenta.

Busca da felicidade

O pesquisador Filip De Fruyt esclarece que estas competências auxiliam diretamente na resolução de problemas que estão sujeitos a surgir em contexto escolar, como o bullying. “Nossa educação precisa preparar pessoas para a vida futura. Não falamos apenas em inseri-las no mercado de trabalho, mas, principalmente, fazer com que tenham uma vida feliz e interessante. Que sejam bons pais, que tenham cuidado com a própria saúde, que pensem de forma sustentável, sejam respeitosos e tenham comportamento cidadão. Ensinar estas competências na escola traz consequências imediatas”, avalia.

Filip também defende que os professores recebam uma formação sólida nesta área. “Temos que cuidar inicialmente do professor, pois é ele quem lida diretamente com o estudante no dia a dia. Queremos professores que realmente façam a diferença na vida das pessoas. Da mesma forma que, numa situação de emergência dentro de um avião, primeiramente o adulto tem que colocar a máscara de oxigênio em si, para em seguida, colocar na criança, assim tem que ser com o desenvolvimento das competências socioemocionais”, considera.

Política implementada

O objetivo da proposta é possibilitar, de forma intencional e planejada, o desenvolvimento pleno de estudantes do Ensino Fundamental II e do Ensino Médio, preparando esses jovens para enfrentar os desafios da vida no século XXI. Tatiana Filgueiras, do EduLab21, salienta que “as pessoas passarão por dificuldades ao longo da vida, sendo preciso prepará-las para que desenvolvam uma força interna e passem por estas situações com resiliência”. Tatiana considera, ainda, que a valorização das diferenças individuais é um caminho para o crescimento. “Simplesmente respeitar e tolerar o diferente não é suficiente, no campo da educação. Sou muito feliz com o que acontece no Ceará, porque apesar de os gestores mudarem ao longo do tempo, a política de respeito ao indivíduo permanece. O Ceará tem uma história de continuidade que serve de exemplo ao Brasil inteiro”, conclui.

Oliver P. John, da Universidade de Berkeley, entende que é preciso despertar nas crianças o senso de proatividade, empatia e responsabilidade para com a coletividade. “Precisamos fazer com que crianças que hoje são observadoras passivas da prática de bullying, por exemplo, mudem de atitude e passem a ser defensoras das que estão sendo intimidadas. É preciso ter empatia para com a vítima e assumir postura de combate a esta prática. Precisamos, ainda, orientá-las a ter boas relações interpessoais, a investir em vínculos duradouras. Além disso, temos que ensiná-las a serem capaz de se organizar nas tarefas do dia a dia e a ter persistência e estímulo para aprender”, finaliza.

Dalila Saldanha, secretária municipal de Educação de Fortaleza, afirma que o município também está engajado na causa. “Sabemos o que representa ter na escola um atendimento voltado para ouvir e acolher os jovens, mantendo proximidade com os pais, conhecendo a história de cada um e tornando o processo educacional mais afetivo. Trabalhar com esta perspectiva tanto favorece aos educadores, como proporciona um aprendizado mais significativo para nossas crianças e jovens, que ainda são carentes de muitas necessidades”, avalia.

Etapas

A proposta é composta por: 1) formações de gestores e professores realizadas presencialmente e a distância para entendimento, customização e implementação na escola; 2) instrumentos e metodologias para o acompanhamento do desenvolvimento de competências socioemocionais pelos professores junto aos estudantes, por meio de conversas e devolutivas que permitem o planejamento e o replanejamento de atividades para o alcance de objetivos individuais dos alunos; 3) instrumentos e metodologias para o acompanhamento do andamento da política educacional pela Secretaria de Educação e 4) uma comunidade de prática, por meio da qual os docentes compartilham e comentam atividades criadas por eles para potencializar o desenvolvimento de competências socioemocionais nas aulas.

Desde o início do ano, essa proposta educacional está sendo oficialmente implementada em 630 escolas estaduais cearenses, como parte da promoção de uma política pública de educação integral na rede. A versão do Diálogos Socioemocionais que funciona na região é voltada a redes públicas de ensino que garantem em seus currículos disciplinas que trabalham específica e diretamente o desenvolvimento de competências socioemocionais. Atualmente, no estado, a iniciativa abrange 340.000 estudantes de turmas participantes do Programa Professor Diretor de Turma (PPDT).

Parceria histórica

Em 2015, o Instituto Ayrton Senna foi procurado pela rede pública de ensino do Estado do Ceará. À época, a Secretaria de Educação tinha como demanda visualizar um “retrato” de como estavam desenvolvidas as competências socioemocionais dos estudantes da rede. O levantamento serviria para tomadas de decisões político-educacionais voltadas à educação integral, ou seja, direcionadas para o desenvolvimento pleno dos estudantes em suas diversas dimensões (intelectual, física, afetiva, social, ética, moral e simbólica).

Para tanto, o Instrumento Senna foi empregado no Estado, tendo sido respondido por estudantes do 1º ano do Ensino Médio, em 2015, e por alunos do 3º ano do Ensino Médio, em 2017. As aplicações possibilitaram perceber o comportamento do desenvolvimento de competências socioemocionais dos estudantes ao longo do Ensino Médio.

Os primeiros anos de parceria e as demandas iniciais vinculadas a todo o processo resultaram em ações piloto em 2017 e em uma assessoria técnica mais abrangente iniciada em 2018. Essa assessoria está estruturada em duas frentes de trabalho. São elas: construção de uma teoria da mudança, a partir dos diversos programas implementados pela Secretaria de Educação, e a implementação do Diálogos Socioemocionais nas escolas da rede vinculadas ao PPDT.

Vale destacar que estudos nacionais e internacionais demonstram que o desenvolvimento de determinadas competências socioemocionais favorece o aprendizado em diferentes disciplinas, como Língua Portuguesa e Matemática, e tem influência na permanência do aluno na escola, na diminuição de ocorrências de violência na comunidade, e em uma série de outras conquistas e realizações ao longo da vida. Tais pesquisas também destacam efeitos positivos do desenvolvimento dessas habilidades sobre aspectos sociais, como empregabilidade, saúde, entre outros.

 

 

12.12.2018

Bruno Mota

Assessoria de Comunicação da Seduc